terça-feira, 20 de janeiro de 2015

A ESTRUTURA DO SIGNO DE CAPRICÓRNIO II



O símbolo Cronos

O mais jovem dos Titãs, filho de Urano, Cronos encerra a primeira geração dos deuses cortando fora os testículos do pai. Para não ser destronado por causa da progenitude, segundo a predição de seus pais, devora os próprios filhos logo que nascem.

Réia, sua irmã e esposa, foge para Creta a fim de dar à luz Zeus. E em lugar do menino, dá a Cronos, para comer, uma pedra. Adulto, Zeus ministra a Cronos (Saturno) uma droga que o faz vomitar todos os filhos que engolira. Com o auxílio deles, Zeus acorrenta Cronos, mutila-o, e abre a era da segunda geração dos deuses.

Cronos é muitas vezes confundido com o Tempo (Chronos), do qual se tornou a personificação para os intérpretes antigos da mitologia. Como tantas vezes acontece, tais interpretações, se bem que fundadas num jogo de palavras, exprimem assim mesmo uma parte de verdade. Cronos, mesmo que não seja identificado a Chronos, tem o mesmo papel do tempo: devora, tanto quanto engendra; destrói suas próprias criações; estanca as fontes da vida, mutilando Urano, e se faz fonte ele mesmo, fecundando Réia.

Simboliza a fome devoradora da vida, o desejo insaciável. Muito mais que isso: com ele começa o sentimento de duração e, mais especificamente, o sentimento de uma duração que se esgota, i.e., que extravasa e passa entre a excitação e a satisfação. Simboliza também o medo de um herdeiro, de um sucessor, de um substituto. Complexo de Cronos, inverso do complexo de Édipo.

Robert Graves estima que não foi um simples trocadilho que permitiu identificar desde a Antiguidade Cronos com Chronos (o tempo), armado com sua foice implacável. Cronos, diz o sábio inglês, é representado em companhia de um corvo, como Apolo, Asclépio, Saturno e o deus celta Brân (celta: corvo) ou Brendigeidfran (“Bran, o abençoado”) e Cronos significa, provavelmente, “gralha”, como no latim cornix e no grego coroné. O corvo era uma ave oracular, que se acreditava habitar a alma de um rei sagrado depois de ter sido esse rei sacrificado. Tal hipótese daria à castração de Cronos uma conotação sacrificial, e o deus mutilado, feito pássaro, simbolizaria, em consequência, a sublimação dos instintos.

Cronos é o soberano incapaz de adaptar-se à evolução da vida e da sociedade. Sem dúvida ele deseja a felicidade de seus súditos e a paz de uma idade de ouro. Mas é ele só quem governa; rejeita toda a ideia de sucessão; não concebe outra sociedade que não a sua. Para transformar-se, o mundo tem de se revoltar, e Cronos ou é castrado pelos filhos ou se retira para o céu. Em outras palavras: ou ele é expulso ou recusa servir a outra ordem além daquela que concebeu e quis. É a imagem mesma do conservantismo cego e obstinado. É vencido, por sua vez, e se seu reinado está ligado à lembrança de uma idade de ouro, é porque esta configura, no tempo que escoa, um período ideal, que concentra a realização de todos os sonhos, e que deve, forçosamente, permanecer imóvel: é a contradição do tempo, uma pausa na evolução inelutável, uma condenação à morte.

Cronos é o chefe acabado dessa perfeição estagnante. O paraíso se basta, é incontestável. As pessoas devem satisfazer-se com ele, não devem ter vontade de deixá-lo. Mas chegam outros seres, com todas as suas possibilidades de inovação e de conflito, com suas tentações de expandir-se, em liberdade e em poder: o que Cronos não poderia admitir, e isso o condena necessariamente à derrota. Ele perde o poder, i.e., castram-no.

O deus Cronos. Fonte: IE / Universidade de Lisboa.

O símbolo Saturno

O Saturno romano não se identifica com o Cronos grego, ao contrário do que afirmam certas interpretações um pouco precipitadas, que só se justificam bem mais tarde.

A sua associação ao rei Jano, que o teria acolhido em Roma, teria deixado a imagem de uma era de ouro: aqui, ele simboliza o herói civilizador e, em particular, aquele que ensina o cultivo da terra. Nas festas que lhe eram consagradas, as Saturnais, as relações sociais eram invertidas – os criados mandavam em seus senhores e estes serviam os seus escravos à mesa. Seria uma obscura lembrança do fato de que Saturno havia destronado o pai, Urano, antes de, por sua vez, ser destronado por seu filho Zeus ou Júpiter?

Para o pensamento hermético, aos olhos dos químicos vulgares, Saturno é o chumbo. Mas para os Filósofos herméticos, é a cor preta, da matéria dissolvida e putrefata, ou o cobre comum, o primeiro dos metais, ou ainda o vitríolo azóico de Raymond Lulle, que separa os metais. Todas estas, imagens que indicam uma função separadora, ao mesmo tempo um começo e um fim, uma interrupção num ciclo e o começo de um novo ciclo, em que a ênfase maior é dada a um corte ou a um freio na evolução.

Na astrologia, Saturno encarna o princípio de concentração, da contração, da fixação, da condensação e da inércia. É, em suma, uma força que tende a cristalizar, a fixar na rigidez as coisas existentes, opondo-se, assim, a toda mudança. O nome de Grande Maléfico lhe é conferido a justo título, pois ele simboliza todo tipo de obstáculo, as paradas, a carência, o azar, a impotência, a paralisia.

O lado bom do seu influxo confere uma profunda penetração, resultante de longos esforços refletidos, e corresponde à fidelidade, à constância, à ciência, à renúncia, à castidade e à religião. Os seus dois domicílios – Capricórnio e Aquário – são opostos aos luminares, portanto, à luz e à alegria da existência. No organismo, ele rege a estrutura óssea.

Saturno é o planeta maléfico dos astrólogos; sua luz, triste e fraca, evoca, desde os primeiros tempos, as tristezas e provações da vida; sua alegoria é representada pelos traços fúnebres de um esqueleto movendo uma foice.

No nível mais profundo da função biológica e psicológica que Saturno representa, na verdade, descobrimos um fenômeno de desprendimento: a série de experiências de separação que se encadeia ao longo da história do ser humano, desde a ruptura do cordão umbilical do recém-nascido até o despojamento supremo do velho, passando pelos vários abandonos, renúncias, sacrifícios que a vida nos impõe.

Através desse processo, Saturno fica encarregado de liberar-nos da prisão interior de nossa animalidade e dos nossos laços terrestres, libertando-nos das correntes da vida instintiva e de suas paixões. Nesse sentido, ele constitui uma força de freio em favor do espírito e é a grande alavanca da vida intelectual, moral e espiritual.

O complexo saturnino é a reação da recusa de perder aquilo a que nos ligamos sucessivamente durante a vida, a fixação cristalizada na infância, o desmame e as situações diversas de frustrações afetivas que levam a uma exasperação da avidez sob várias formas (bulimia, cupidez, ciúme, avareza, ambição, erudição), ligando o aspecto canibalesco do mito ao tema de Cronos devorando os seus próprios filhos.

A outra face desse Jano apresenta o quadro contrário de um desprendimento excessivo sob os diversos aspectos da auto-anulação, da desistência do ego, da insensibilidade, da frieza, da renúncia extrema que resulta no pessimismo, na melancolia e na recusa de viver.

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