A constelação de Câncer. Fonte: Astromax. |
Por fim, o
último post, como de costume, traz uma abordagem mais filosófica sobre o nosso
período canceriano do ano.
Espero que
tenham gostado, e que façam um bom uso.
Câncer
A vida toda é um conflito básico entre as forças que
buscam isolar certo número de elementos diferentes, depois integrá-los num
organismo relativamente sui-generis e independente, e as forças que procuram
romper o isolamento da entidade individual, e dessa entidade fazer uma das
muitas unidades dentro de um conjunto mais vasto, a cujo ritmo e finalidade
servem.
O modelo cíclico duodécuplo do zodíaco é um admirável
instrumento para cartografar em todo e qualquer nível as diferentes fases da
luta, sempre renovada, entre a tendência para a individualização e o impulso
para a coletivização.
No tipo humano de Câncer vemos em ação tanto o mais
puro ou mais "áspero" individualismo – quanto uma sensação singular
de temor e ressentimento motivada pela compreensão inexorável de que a maré
virou e que a sociedade e seu poder coletivo acabará prevalecendo sobre o
indivíduo. A pessoa de Câncer é mais conscientemente individualizada, porém
mais temerosa subconscientemente da inevitável pressão das exigências que a
vida, a sociedade, a humanidade como um todo, e por fim Deus, devem fazer e
farão.
A mais concreta expressão dessas exigências é a
criança – e o lar que ela torna necessário. Para uma mulher, estar grávida é
abrir mão da individualidade de consciência arduamente conquistada – bem como
de sua estrutura física. Para um homem, tornar-se o sustentáculo de um lar é
ter sido colhido pelas engrenagens das obrigações sociais, da respeitabilidade
e da normalidade social. A vida prevaleceu sobre a mãe; a sociedade prevaleceu
sobre o chefe de família.
Câncer é o símbolo de integração pessoal, particular.
Representa a vontade de estabelecer um fundamento de identidade e consciência
sobre um dado conjunto de valores, limitado; representa a vontade de
estabelecer um foco claro mas estreito para a operação da vida e da mente.
A necessidade de Câncer é satisfeita quando o medo da
ideia misteriosamente opressiva de "perder-se numa vasta entidade
coletiva" se transforma na compreensão do lugar que a pessoa ocupa, por
direito próprio, em tal entidade; que tal pessoa saiba e conheça o seu lugar. E
isso não quer dizer mero conhecimento intelectual ou cerebral; trata-se de um
conhecimento que pertence às raízes do ser, nas profundezas do sentimento,
assim como nas alturas da intuição espiritual.
Tudo isso junto significa que os vagos presságios de
se perder numa imensidão coletiva só podem ser mitigados se esse tipo de pessoa
puder encontrar lastro numa situação, função ou localidade claramente definidas
e que ela mesma possa visualizar.
Os homens morrem de pavor onde não há nada para ouvir
nem ver; onde a duração infinita não pode ser transformada em períodos de
tempos com o martelar de um relógio de pêndulo; onde seus egos se sentem
escorregar para o mar do Nirvana. Eles devem estar ligados a um lugar e a uma
função, a uma forma e a um nome. Apegam-se com tenacidade, como com pinças de
caranguejo – símbolo de Câncer. Prendem-se, como todos os homens, a suas
realizações, temerosos do misterioso desconhecido em que não podem distinguir
sua própria posição... ainda que o desconhecido seja Deus.
Não há jamais nenhuma necessidade de ter medo ou de
se estar em necessidade. Tudo o que precisamos fazer é nunca impor limites à
nossa satisfação, nunca nos deter com receio do refluxo da maré. No espírito,
as alturas e as profundidades são como uma coisa só. Tudo o que há é movimento,
ritmo e harmonia eterna.
O engenheiro constrói um dique para reter as águas de
um rio, de modo a poder transmudar o poder de gravitação – o desgaste de toda
energia – em eletricidade e luz; mas o dique não pode, sem riscos à segurança,
atingir alturas superiores a certo nível; do contrário, a pressão das águas que
ele contém o faria aluir. O indivíduo, analogamente, não pode continuar sempre
aumentando a tensão de seus processos de pensamento; do contrário, sua mente
pode estourar sob a pressão de um excessivo poder e de um exagerado número de
descobertas estimulantes.
O homem precisa parar e amealhar dentro de alguma
sólida estrutura o espólio que acumulou em sua vitória sobre a natureza. Antes
de poder usar criativamente a inteligência ele precisa incorporá-la numa
estrutura de identidade – uma estrutura que possa sustentar a massa de materiais
que ele ganhou da experiência.
O homem precisa de estabilidade. Cedo ou tarde, deve
parar em seu guloso açambarcamento de sensações e experiências. Onde pare um
homem, aí estará seu fundamento: sua personalidade, seu lar – e, por fim, a
estrutura de sua condição de existência após a morte. Sobre esse fundamento,
ele edifica. Estabeleceu os limites de seu desenvolvimento potencial.
Ascender às alturas requer fundamentos profundos.
Logo, o problema de atingir picos elevados de inteligência e, desse ponto
privilegiado, ser capaz de abranger um vasto panorama de consciência é, antes
de tudo, um problema determinado pela profundidade que se esteja disposto e
preparado para atingir. Profundidade aqui significa proximidade do centro.
Alcançar o centro é atingir o cerne do vazio em torno
do qual todas as massas e todas as energias estão equilibradas. É ganhar um
poder de ação de alavanca, com o qual toda a natureza possa ser movida e
controlada.
Há homens, e até civilizações inteiras, que buscam
estabilidade derramando-se sobre uma ampla superfície de experiências. A
estabilidade intelectual é uma "estabilidade de mapas" – uma
abstração de aparências superficiais.
Nossa civilização moderna está construída sobre mapas
e sobre uma consciência cartográfica. Mas o globo que ela vislumbra é
essencialmente um invólucro vazio. Não possui vida interior; não tem centro;
sequer um foco originador.
O centro vivo é um vácuo para nosso intelecto e para
nossas percepções de massa e substância. Através desse vácuo, o poder criativo
do universo fala. A questão que diferencia os homens, o espírito e a realidade
é: "Qual é a profundidade de suas raízes? Qual é o grau de segurança de
seus alicerces?"
Os homens que chegaram ao centro, canalizam essas
respostas. Eles criam, eles destroem. Através dos olhos deles, que conhecem o
vazio supremo, por suas mãos, que podem arar a superfície de tudo, o Eterno a
Si mesmo se dá a conhecer.
Tríptico Astrológico, D. R.
Alisson
Batista
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