As fases de Vênus, de G. Galilei. Fonte: Instituto Humanitas Unisinos. |
O planeta Vênus
Ora "estrela matutina", ora
"estrela vespertina", o fulgente paramento do planeta Vênus é um
prelúdio ao Sol nascente ou um posfácio do pôr-do-sol.
Vênus brilha mais que qualquer outro astro, seu manto nebuloso branco-amarelado reflete a luz com muito mais eficácia que a superfície parda e poeirenta da Lua. Quase 80% da luz solar derramada sobre Vênus simplesmente rebate do topo das nuvens e é espargida de volta para o espaço (a Lua, em contraste, devolve apenas 8%).
Vênus chega a 38 milhões de quilômetros em sua passagem mais rente pela Terra – mais perto do que qualquer outro planeta. Mesmo quando Vênus e Terra se afastam ao máximo, quando estão apartados por mais de 240 milhões de quilômetros, Vênus preserva um brilho superlativo para os observadores terrestres.
Nenhuma das características superficiais de Vênus pode ser discernida visualmente devido à sua cobertura de nuvens. Assim, as mesmas nuvens que explicam a garrida visibilidade do planeta também atuam para velá-lo. De qualquer modo, a maior parte da face do planeta é constituída de vulcões, de todos os tipos, em planícies recobertas de lava.
Os gêmeos Terra e Vênus são bem
diferentes
Se existem dois mundos que clamam por
comparação são os planetas gêmeos Terra e Vênus, por serem os mais parecidos em
tamanho e orbitarem o Sol a distâncias similares. As primeiras descobertas
sobre Vênus feitas de longe – em especial, a detecção de sua atmosfera pelo
astrônomo e poeta russo Mikhail Lomonosov em 1761 – insuflaram em toda parte
fantasias de um mundo frondoso e vicejante com vida semelhante à terrestre.
Estudos recentes, no entanto, têm
apenas exposto contrastes gritantes entre os dois planetas.
Hoje Vênus assa e se resseca sob um céu
obscurante que bloqueia a luz mas aprisiona calor. Sua atmosfera consiste quase
inteiramente (97%) de dióxido de carbono, o mais eficiente e pernicioso de
todos os gases do efeito estufa, efeito que mantém a temperatura acima de 430
graus Celsius em todo o planeta – no hemisfério noturno, no hemisfério diurno e
até nos pólos. O dióxido de carbono abundante recai sobre o terreno quente de
Vênus com pressão noventa vezes maior que a da atmosfera da Terra, uma pressão
atmosférica comparável à existente na água novecentos metros abaixo do nível do
mar.
Paisagem de Vênus. Fonte: Diário de Notícias. |
O planeta gira tão devagar que um único
dia demora dois meses terrestres para avançar da alvorada ao ocaso. Cerca de
trinta quilômetros acima da superfície começam as nuvens, em camadas de 25
quilômetros de espessura, sem uma única brecha em sua cobertura, impedindo o
Sol de mostrar-se durante todo o curso do longo dia venusiano. Somente os
comprimentos de onda vermelhos conseguem perpassar o dossel de nuvens.
As nuvens venusianas configuram-se em
remoinhos sombrios, que se movem a cerca de 350 quilômetros por hora,
circulando o planeta inteiro a cada quatro dias terrestres na forma de
devastadores vendavais.
Ao contrário de todos os outros
planetas, Vênus gira de leste para oeste, ainda que se mova junto com eles para
o leste em torno do Sol. Os astrônomos atribuem o giro invertido a alguma
colisão violenta que emborcou o planeta no início de sua história.
Muitos intrusos potenciais são
vaporizados ao atravessarem a espessa atmosfera e nunca atingem o solo, de modo
que só os objetos impactantes mais volumosos chegam intactos à superfície. Sombras
brilhantes condizem com a aparência juvenil de um planeta que só recentemente
(nos últimos 500 milhões de anos) foi recoberto por verdadeiras enchentes de
lava, que encobriram ou taparam praticamente todos os vestígios (cerca de 85%)
de seu passado remoto.
Ishtar
Lendas antigas celebraram a beleza do
planeta Vênus declarando-o não apenas divino, mas feminil – talvez porque suas
visitas geralmente duram significativos nove meses. Embora orbite o Sol em
apenas 224 dias terrestres, o movimento orbital da Terra interfere no
comportamento observado de Vênus. Visto da Terra em movimento, ele permanece em
média 260 dias como estrela matutina ou vespertina, o que coincide com o
período de gestação humana, entre 255 e 266 dias.
Os caldeus chamavam o planeta de Ishtar, a deusa do amor que ascende aos céus, enquanto para os sumérios semitas Vênus era Inanna, "a Dama das Defesas do Céu". A natureza dual (auroreal e crepuscular) de Vênus projeta-o para seus admiradores ora como virgem, ora como vamp.
Ishtar metamorfoseou-se em Afrodite, a
encarnação grega do amor e da beleza, que se tornou Vênus para os romanos e foi
reverenciada pelo historiador Plínio por disseminar o orvalho vital que
excitava a sexualidade das criaturas terrestres.
O belo semblante de incontestável
pureza fez de Vênus outrora a musa dos poetas, mas as novas odes a Vênus devem
ser inspiradas agora por impressões bem informadas de sua beleza – uma beleza
selvagem.
Os Planetas, D. S.
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