Estátua da Vênus de Milo, desenho de Elle-Alyssa. Fonte: Devianart. |
Todos os signos do zodíaco estão equilibrados em
torno do eixo equinocial que liga Áries e Libra.
No princípio do caminho, quando o indivíduo se
defronta com os desafios que necessariamente se lhe opõem à determinação de
emergir do seio do coletivo e atuar a partir do seu próprio centro, a maior
necessidade é a da adaptabilidade. Ele deve, antes de tudo, sobreviver. Ele não
deve trair a si mesmo e ao seu objetivo mais íntimo, entregando-se aos poderes
da humanidade coletiva, que procuram reduzir todo indivíduo à média e ao
inconsciente. Não deve procurar romper com impaciente ansiedade e adolescente
egocentrismo as defesas da sociedade. Deve aprender a ajustar-se à necessidade
global dos tempos, camuflar seu propósito e tornar sua vontade férrea um pouco
mais dúctil.
Quando metade da jornada em torno de si próprio – e
de seu mundo – já tiver sido feita, ele
terá aprendido muitas lições. A suas necessidades sempre alteradas, o espírito
respondeu com vários e maravilhosos dons. Ele se sente, agora, bastante seguro
de si. Mas e os outros homens? Até agora ele os considerou como riscos do
caminho, como material para ser dominado e vencido. Enfrentando-os, ele sentia,
acima de tudo, que se estava confrontando com sua própria natureza objetificada
– a natureza humana. A última lição que aprendeu foi a da tolerância, a
compreensão de que o desenvolvimento total da identidade significava abandonar
as limitações e a rigidez dos juízos centrados no ego e acolher tudo o que
fosse diferente porém assimilável.
A abrangência, ou inclusividade, representa um grande
esforço sobre a mente e os sentimentos. Defrontar-se com seres humanos seus
iguais, que também declaram ter-se elevado como indivíduos do seio da
coletividade – defrontar-se com eles para atuar no sentido de uma meta comum,
apesar das diferenças superficiais –, isto realmente apresenta sérias
dificuldades A sensação de segurança, própria do indivíduo jovem, pode
desaparecer subitamente quando ele se torna plena e vitalmente consciente de
que a sociedade não é apenas alguma coisa a explorar em benefício próprio: em
sua mais elevada expressão, ela é uma forma de cooperação e de participação –
um relacionamento do tipo dá-cá-toma-lá.
Mas que dizer dos jovens inteligentes e sensíveis que
se veem, com a usual falta de preparo, em face de problemas pessoais de
convivência – de cooperação num intercâmbio constante? Que maior benção
poderiam eles pedir ao espírito senão o dom do “desembaraço”?
Desembaraço não é só liberdade em relação à agitação,
ao constrangimento, à aflição, à tensão ou ao medo. Não é sequer uma simples
forma de tranquilidade ou de conforto, ou facilidade de efetuar este ou aquele
tipo de ação. É tudo isso: porém, mais importante ainda, é a compreensão de que
a “cooperação” é mais que mera “operação”, que o todo é mais que suas partes e
do que a soma total de suas partes. É a sensação de estar sendo acionado por
uma vida maior que abrange e contém todos os componentes de uma situação, ou de
uma relação de que fazemos parte.
Se você e eu vitalmente compreendemos – e não apenas
concebemos intelectualmente – que somos partes atuantes de um todo, com cuja
totalidade nos tenhamos sentido unificados, como poderia não haver desembaraço
entre nós? O que age em nós já não sou eu nem é você, mas o Nós criado e
criador; e, no limite, Homem, ou Deus. E isto se aplica a toda situação
concebível.
O desembaraço é a ausência dos fantasmas de ontem e a
completa identificação com um amanhã abrangente. O desembaraço é a recusa a
deixar-me bloquear pelas coisas que desconheço ou que não fiz. Implica a total
convicção de que se eu e essa nova ação a ser realizada nos estamos defrontando
numa dada situação, essa situação inclui a mim e a ação, e se satisfará através
de minha atuação, contanto que “eu” não interfira – o “eu” todo cheio de
fantasmas.
O desembaraço é uma expressão de uma relação
totalmente aceita – seja com um objeto, com uma situação ou com outra pessoa. É
a total falta de reserva mental na abordagem de um relacionamento e nos atos
que esse relacionamento requer.
Astraea com a balança. Fonte: Logoinn.net. |
Pessoas bem pouco familiarizadas com os símbolos do
zodíaco costumam falar do refinado pendor social do tipo de indivíduos de
Libra. Mas devemos compreender que esse pendor é em muitos casos tentativas de
esconder o medo. Nas suas profundezas, o tipo de Libra poderá sempre encontrar
(se tão-somente ousar investigar) uma resistência sutil, inconsciente, mas em
geral muito poderosa, contra uma relação total. Essa resistência existe apenas
porque a relação total representa para ele um passo à frente. Ele o sente de
forma subconsciente: e, sentindo-o, resiste-lhe. Se atinge o desembaraço
social, é essencialmente por vencer essa resistência e uma sensação de
inferioridade social – assim como as impulsivas bravatas do tipo de Áries são,
por via de regra, uma tentativa exagerada de compensar um sentimento mordente
de insegurança pessoal.
Deve-se entender que, no tipo de personalidade de
Libra, o real “desembaraço” não deve ser tido como favas contadas. Se ele
efetivamente se manifesta, é dom do espírito – e portanto sendo uma
manifestação nascida do espírito, tanto satisfaz uma necessidade vital como tem
que vencer um medo subconsciente. A personalidade do indivíduo – tanto quanto
sua história – nunca se transforma salvo pela vitória; e não há vitória sem
luta e sem fé no êxito final.
A luta pode ser necessária; mas a única grande luta
que leva saúde à alma e ao corpo é o esforço de vencer a inércia, a indiferença
espiritual e a dúvida de que haverá vitória. Não uma luta contra alguma
entidade específica, a ser empreendida com músculos tensos, coração contraído e
vontade tenaz; mas, ao contrário, uma luta por entendimento, abrangência, amplitude
de visão e maior luz.
A grande prova do desembaraço está em que todas as
pessoas por ele confrontadas também sentirão desembaraço, respondendo com a
plenitude de sua natureza à rica infusão do outorgador de dons.
Aliás, a fonte do desembaraço pode ser encontrada em
toda parte da alma do corpo. O desembaraço difunde-se desde o centro do ser,
apenas porque o centro recolheu em si mesmo a messe que cresceu de toda a
natureza. Supressão, repressão, uma sensação de inadequação ou de culpa, medo,
e o orgulho nascido do medo, todos esses produtos de uma civilização que
teoricamente dá ênfase à moralidade a todo custo, e de uma vontade
sobrecarregada com a crença no pecado, são testemunhas de uma incapacidade
básica de confiar em Deus e em Sua promessa abundante de vida. São produtos da
escassez. A moralidade, como por tradição a conhecemos, é escassez do espírito.
Gradativamente uma moralidade de abundância
espiritual irá tomando forma entre os homens. Será uma moralidade que é a
totalidade operando através de todas as partes do organismo social; uma
moralidade que se recusa a ser obsedada pelos pecados espectrais dos
indivíduos, e que considere todo homem responsável pela falha de todo outro
homem; uma moralidade que estabelecerá a prioridade espiritual do todo sobre as
partes e cantará a relação satisfeita onde os homens do passado lamentaram seus
pecados e decepções individuais. A glória a coroar tal moralidade será o
desembaraço no viver, o desembaraço no ser – o desembaraço também é a antífona
do amor.
O desembaraço é a fragrância de um amor tão
harmonioso que os participantes têm comunhão completa uns com os outros, nos
sentimentos e nas ações. O desembaraço é a fragrância da felicidade. É
simplicidade transformada em paz: paz cantando de si para si no silêncio do
viver consumado. Assim como a videira estende suas gavinhas para alcançar a luz
e a árvore que a sustém, como a água jorra delicada pelos prados que veste de
verde abundância; como as nuvens dançam no céu com graça multiforme, da mesma
forma – com as almas livres da escassez do amor e da pobreza do espírito, e os
corpos alegrando-se à luz e ao calor do Sol, as mentes recolhendo ideias dos
jardins da divindade, como as abelhas recolhem o néctar das flores – assim os
homens e as mulheres de amanhã conhecerão o prodígio do desembaraço.
Conhecê-lo-ão totalmente: e conhecendo-o, conhecerão a Deus.
Tríptico Astrológico, D. R.
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