Capricórnio e Augusto. Fonte: CoinQuest. |
Posição
Todo ciclo completo de experiência individual começa
numa afirmação de identidade: “eu sou eu” (fase 1). Mediante o uso das energias
da natureza que, por direito inato
biológico, social e espiritual, se enquadre dentro de seu campo de operação
(fase 2), depois mediante os processos associativos de pensamento (fase 3), o
“eu” que era no princípio apenas “eu” – um ritmo, uma qualidade de ser –
transforma-se numa pessoa, num todo concreto e organizado (fase 4). Tendo
experimentado a grande prova da “estabilidade” e escolhido um tipo de
fundamento – em extensão de superfície, em enraizamento na terra, ou na
compreensão do centro, vitorioso sobre a gravitação – a pessoa individual
procura exprimir de modo característico as energias de sua personalidade (fase
5).
Há meios corretos e incorretos de usar o poder
oriundo de um organismo concreto. Eles levam a uma proficiência cada vez maior
de ação, ou à dor e à devastação (fase 6). Através da disciplina e do
sofrimento, o homem aprende as lições de objetividade e respeito: deixando de
aprendê-las, seu sentido de isolamento individual ou de frustração se converte
em invalidez física e psicológica, em rebeldia ou rancor.
Nenhum indivíduo pode experimentar uma existência
completa e frutífera isoladamente. Ser é entreter relacionamentos (fase 7). O
relacionamento vivido com um espírito de mutualidade produz muitos frutos (fase
8). À medida que as responsabilidades que constantemente surgem na gestão dos
frutos da parceria e do amor são partilhados por todos os participantes no
relacionamento, brota o entendimento nas mentes iluminadas; atividades
conjuntas fisicamente proveitosas adquirem sentido e valor (fase 9). Elas se
integram dentro do campo de uma cultura, de uma religião, de uma sociedade de
personalidades significativamente interdependentes e instruídas nos caminhos
dos relacionamentos – de relacionamentos que “fazem sentido”, porque se referem
sistemática e inteligentemente a um todo harmônico em formação (fase 10).
A sociedade humana está eternamente em formação.
Mesmo quando uma certa sociedade ou cultura esteja exteriormente se
desintegrando, como uma planta no outono, suas “sementes” estão amadurecendo e
sendo disseminadas mesmo em meio à decadência. A vida em sociedade subentende
participação num constante processo de integração ou desintegração. A
participação do indivíduo, homem ou mulher, no processo social pode ser
positiva ou negativa. Pode edificar ou manter, transformar ou destruir valores.
Pode significar, para o indivíduo, alegria e sucesso no desempenho de suas
responsabilidades nascidas dos relacionamentos – ou quase escravização a um
ritmo alheio e insalubre de trabalho, do qual ele não aufere nenhum valor,
salvo o mero fato de existir com relativo conforto e ao qual ele não acrescenta
nenhuma visão criativa ou intensidade dinâmica.
A contribuição do indivíduo aos processos sociais –
seja nas tarefas do lar ou na fábrica, nos campos ou no mar – estabelece seu
lugar e função na sociedade. O caráter do relacionamento entre o “eu”
individual e este fator de lugar-e-função é um dos quatro fatores constitutivos
básicos de toda personalidade – um fator “cardeal”, que determina (juntamente
com os outros três) o “enfoque total e quádruplo da vida” de qualquer um.
À medida que uma pessoa particular vive numa certa
localidade e em termos das características específicas de sua raça, classe,
família, religião, nível cultural-econômico e espiritual, seu “lugar” é por
esse modo determinado – e, se ela aceitar as responsabilidades sociais
associadas a esse lugar, sua “função” também. Em algumas sociedades o fator
lugar-função é quase inteiramente predeterminado pelo nascimento e por herança.
Nos países democráticos mais modernos todo indivíduo pode escolher – ao menos
em teoria – seu lugar e função dentro da economia da sociedade.
Qualquer pessoa que funcione ativamente, de acordo
com o lugar por ela ocupado na sociedade, tem uma “posição”. Nessa palavra posição, vemos combinados muitos elementos sociais
e psicológicos que permitem caracterizar, muito adequadamente, a décima dentre
as provas básicas que a existência individual sobre a Terra depara a toda
pessoa ativa em qualquer tipo de agrupamento social. A posição implica o fator
de lugar; porém, mais que isso, ela se refere ao fato de que todo homem em
qualquer “posição” deve assumir plenamente as responsabilidades de sua posição
e pode exercer, ainda que em pequeno grau, algum tipo de influência e
autoridade. Posição, do ponto de vista social, é lugar com referência a um todo
operativo e organizado. Ela inclui atividade funcional e, sempre que a função
seja preenchida com eficácia, prestígio.
Qualquer sociedade em que a “posição” confira
prestígio a um indivíduo mesmo que ele não satisfaça, ativa e eficazmente, os
requisitos de suas responsabilidades, é em certo sentido uma sociedade
insalubre e espiritualmente perversa. A posição de um homem na sociedade deve
sempre ser a fruição de sua identidade individual; deve ser a prova e
consagração de sua realização como indivíduo. A “prova das obras” é exigida
pelo espírito a qualquer pessoa que busque experimentar a plenitude do viver
individual. Deve, igualmente, ser exigida pela sociedade que, só depois de dada
a prova, tem o direito de outorgar prestígio e autoridade. Essa outorga é o que
significa “com-sagração”: o Todo dotando um participante individual de sua vida
com autoridade e delegação de poder; confiando-lhe um “ministério”. A união da
pessoa certa com o cargo ou ministério significativo é a consumação de toda a
existência humana, seja qual for o nível em que o ser social ou espiritual
dessa união se efetive.
A prova da posição é, pois, a que vem coroar a
experiência de vida de um indivíduo. A sua atitude em relação a uma posição é o
fator pelo qual ele será julgado social e espiritualmente. Por ela ficará ele
de pé ou cairá como pessoa individual. E “posição”, aqui, significa qualquer
tipo participação eficaz na vida da sociedade e da humanidade em termos dos
requisitos “orgânicos” da coletividade de que o indivíduo conscientemente faz
parte e à qual ele sente, com a totalidade de seu ser, que “pertence”.
Nenhuma posição é menos nobre que qualquer outra. O
varredor de ruas que mantém limpa a cidade, a dona-de-casa cumprindo suas
tarefas do lar, o trabalhador das minas, o escriturário ou o político, o
artista reformador ou o religioso que levam outros a um novo caminho de
transformação social e ética e de criatividade espiritual – todas essas pessoas
detêm “ministérios” e realizam tarefas funcionais em sua comunidade. A maneira
pela qual desempenham essas tarefas determina não só sua situação social como
também sua situação espiritual como indivíduos.
A qualidade desse desempenho é, por sua vez, determinada pelo caráter do enfoque progressivo que os trabalhadores tenham dado a esta culminação – a este “zênite” – de vida pessoal; pela maneira como eles gradativamente se prepararam, e foram preparados mediante sua educação, para esta prova crucial de “desempenho”. Nenhuma pessoa, no exercício efetivo de uma função, pode dar mais do que investiu no processo de preparação para ela.
Ela se vê compelida, pela própria pressão de suas atitudes precedentes, a enfrentar as provas de poder e autoridade de acordo com a circunstância de esse poder e essa autoridade terem vindo a ela em resultado de relacionamentos tornados profícuos em matéria de inteligência e entendimento, ou se buscou incansavelmente adquiri-los açambarcando a energia nascida do relacionamento a fim de alimentar sua ambição.
Entendimento e ambição são as duas vias para adquirir “posição”; e cada uma delas baseia-se num tipo de enfoque do relacionamento humano e do uso dos frutos desse relacionamento – o enfoque positivo ou negativo. Cada qual por sua vez, todo homem enfrenta os problemas de relacionamento humano, de acordo com o modo pelo qual tenha encarado seu próprio eu e tenha edificado sua personalidade. A totalidade da vida pessoal é consumada no uso que se faz do “poder social” – poder não gerado pelo indivíduo como organismo isolado, mas sim pela interdependência e cooperação (consciente ou inconsciente) de um grupo de indivíduos. Será este poder de posição ou encargo considerado como uma custódia ou como um fruto de pilhagem? Cabe a todo indivíduo escolher. Na maioria dos casos, a escolha está condicionada pela cultura e tradição específicas da pessoa, por um dado tipo de educação e pelas oportunidades que lhe foram oferecidas pela sociedade.
A tragédia de nossa democracia individualista está em que toda a tendência da sociedade é no sentido de, sutil ou grosseiramente, fazer o indivíduo considerar todo o poder ou autoridade que lhe vem para às mãos em decorrência de sua posição social, como algo estritamente, e sem reservas morais, “seu”. Este poder ou autoridade é apresentado como se fosse exclusivamente para ele mesmo usar como bem lhe parecer e sem levar em conta o bem-estar da sociedade em geral. Entretanto, o poder ou autoridade desse tipo é de fato gerado pelo indivíduo na medida em que ele participe da vida de toda a comunidade, e não em sua condição de pessoa isolada. Não constitui um fator “privado” mas “público”.
É certo que todos os membros de uma comunidade dividem entre si as vantagens e os confortos assegurados por sua vida em comum. A sociedade concede a cada indivíduo que a compõe uma quota de participação nos benefícios de sua civilização e cultura; toma também, sob a forma de impostos, uma parte de todos os lucros auferidos pelo indivíduo como pessoa social. No entanto, a atitude individualista básica da maioria dos seres humanos imprime tão profundamente a qualidade da cupidez em todo ganho que um indivíduo aufere de seu trabalho, como membro da sociedade, que a herança sócio-cultural – a colaboração oculta de todos para o progresso social de cada um – é vista como coisa já de si garantida ou então é ignorada. O individualista grosseiro viola a natureza e a sociedade, tiraniza o fraco e o congenitamente oprimido a fim de apresentar sua própria ambição; usa o que pode tirar da vida coletiva de seu povo para engordar seu egoísmo, ou malbarata-o para lisonjear o seu capricho entediado.
identidade e relacionemtno devem integrar-se em trabalhos consagrados; não o podem ser em nada mais. Sempre que um fator usa o outro para sua vantagem exclusiva, os valores humanos se pervertem; o “Homem” sofre um perpétuo aborto. Toda vez que um indivíduo usurpa o poder inerente a seu cargo ou função – ainda que seja o de uma enfermeira ou de um chefe de seção numa fábrica – a fim de expandir seu ego e sua riqueza a expensas da atividade social que é de sua responsabilidade executar, o Homem sofre. Toda vez que uma sociedade – através de seu núcleo central de poder e autoridade, que é o Governo – torna os indivíduos subservientes ou escravos de sua ambição por expansão coletiva e de sua cobiça de poder, o Homem é brutalizado.
Um individualismo absoluto é, em última análise, tão
nocivo aos valores espirituais quanto o coletivismo absoluto. O rude
individualismo dos tempos de expansão de fronteiras, por mais que pareça
historicamente útil, é tão contrário à satisfação do Homem quanto o é um
coletivismo totalitário todo imbuído da vitalidade de metas criativas. Não pode
haver, em última análise, nenhum valor verdadeiramente espiritual exceto como
fruto da harmonização das duas polaridades.
Neste fator de “posição” o indivíduo e a sociedade se
encontram. O homem e seu cargo se tornam uma coisa só – e são ambos sagrados.
Porque, considear o homem como seus próprios o poder e a autoridade decorrentes
de seu cargo e utilizá-los ao sabor de suas emoções ou segundo os caprichos de
seu ego – este é o maior de todos os crimes. Mas tão grande quanto este é o
crime de uma sociedade que escraviza o homem a seu cargo, para que a sociedade
e os mecanismos controladores do estado se agigantem e se tornem mais
poderosos.
Nosso mundo moderno está dilacerado e brutalizado
pela ocorrência maciça de ambos esses tipos de crime. As guerras mundiais são
os sintomas, não as causas, da deterioração do Homem. Indivíduos definham e
morrem sob tortura; nações inteiras se esboroam, ao passo que as burocracias se
tornam cada vez mais prepotentes. Por quê? Não compreenderam que a identidade
individual e o relacionamento em grupo constituem os dois pilares da
civilização, os dois membros de sustentação do Homem. Deixaram de respeitar o
caráter sagrado tanto do cargo como da pessoa individual que o desempenha.
Os indivíduos se tornam mecanizados, autômatos; as
comunidades se convertem em cemitérios do espírito criador. A civilização se
torna a “Sombra” do Homem, um pesadelo pleno das atividades catabólicas dos
homens que são, na mente, destruidores e, em suas vidas emocionais, neuróticos
varridos. Eis aí o retrato de nossa moderna civilização ocidental.
Entretanto, além e acima da Sombra, figura a
Personagem Iluminada. Ser um sol é emitir luz sobre um grupo de corpos obscuros
que gravitam, anelantes de luz, em torno do núcleo radioso de nossa dádiva. A
estrela do verdadeiro zênite converte-se na “posição” do sol do meio-dia apenas
no equador. À proporção que raia o poder “solar” de sua identidade através de sua
atuação social (seu “cargo”), o indivíduo autodedicado cumpre seu papel na
sociedade apenas na medida em que se equilibre em esplendor equatorial, à
proporção que Norte e Sul sejam igualmente ativos em sua personalidade
realizada e “global”.
Essa é a condiçãoda plenitude humana; e para ela a
humanidade, tendo-se visto às voltas com a morte e as devastações da guerra,
pode estar vagarosamente – ah! quão vagarosamente – dirigindo o seu curso, por
mais longínquo que esteja seu objetivo final. Mas mesmo a plenitude pode lançar
sombras, as mais densas de todas! Plenitude material significa máximo de peso e
opacidade, bem como total ausência de espírito. Pode ser tida por sucesso, e
todavia ser a morte de tudo quanto é real e criativo no homem. Pois muitos há,
infelizmente, a quem o proprio sucesso faz malograr, como nenhuma outra coisa!
Há cegueira em todos os sóis a pino; facinoroso calor em todos os equadores.
A plenitude espiritual reside apenas onde as estrelas
se constelam na inteireza translúcida do céu, símbolo da Deidade. Aquele que
pode experimentar o sol da meia-noite no pino do dia; aquele cuja estrela
zenital à meia-noite pode ser como um sol iluminando todos os homens – esse tal
é, na verdade, a encarnação de um deus. Ele é o espírito universal incorporado
num ministério. Nessa incorporação – e em nada mais que nela – o indivíduo
alcança a plenitude do espírito, pelo espírito, e para todos os homens.
Tríptico Astrológico, D. R.
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