A mutilação de Urano por Saturno, de G. Vasari e C. Gherardi. Fonte: Wikipedia. |
O
simbolismo do planeta Urano
Este planeta, descoberto em 13 de março de 1781 por
William Herschel, representa, na astrologia, a força cósmica que provoca as mudanças
e agitações repentinas, bruscas e imprevistas, das intervenções, das criações
originais e do progresso.
O espírito novo que há dois séculos inspira a
humanidade provém principalmente deste astro, que é, aos olhos da astrologia, o
verdadeiro criador do mundo moderno, fundado sobre os princípios da Revolução
Francesa, no plano social, e sobre a maquinaria e a industrialização, na esfera
do trabalho.
O seu domicílio é o Aquário, que divide com Saturno.
No organismo humano, ele rege os nervos e as doenças provocadas por sua
influência; são doenças nervosas, os espasmos, as cãimbras e os enfartes.
O processo uraniano situa-se, originalmente, como um
momento de cólera do Caos: é o despertar do fogo primordial. Diante do deus dos
oceanos há, portanto, o deus do céu, cuja ambição primeira é libertar-se do
indiferenciado, do oceânico e, consequentemente, elevar-se, altear-se, como se
quisesse individualizar-se ao máximo.
Tudo o que liberta o homem da terra, que o eleva ao
céu, que é o seu império mitológico, e o orienta em direção ao absoluto do
esforço vertical está sob os seus auspícios, desde o mais simples arranha-céu
até o foguete interplanetário, passando pelo avião e pelo satélite
artificial...
Este processo uraniano desenvolve-se sobre a linhagem
do homem-prometeu; este é verdadeiramente o raptor do fogo celeste,
instintivamente voltado para as proezas e as façanhas; trata-se sempre de bater
um recorde, de fazer mais ou de ir mais longe que o anterior. Possuído pelo
instinto de excessivo e de força, é o homem do progresso em busca de uma nova
era, se não fracassar na aventura de aprendiz de feiticeiro.
No fundo desse processo distingue-se o arquétipo da
hiperindividualização, que particulariza o ser humano numa originalidade
superpersonalizante, geralmente no paroxismo do Ego, em busca da mais explosiva
unidade, e voltado para o absoluto.
O deus
Urano
Deus do Céu, na teogonia de Hesíodo. Símbolo de uma
proliferação criadora sem medida e sem diferenciação, que destrói, por sua
própria abundância, tudo que engendra.
Caracteriza a fase inicial de toda ação, com sua
alternância de exaltação e depressão, de impulso e queda, de vida e morte dos
projetos. Vem a simbolizar desse modo o ciclo dos desenvolvimentos.
Deus celeste das religiões indo-mediterrâneas, um dos
símbolos da fecundidade, ele
é representado pelo touro. Mas essa fecundidade é perigosa. Como bem observou P. Mazon no seu
comentário à Teogonia de Hesíodo, a mutilação de Urano põe fim a uma
fecundidade odiosa e estéril, introduzindo no mundo, com a aparição de Afrodite
(nascida da espuma ensanguentada do membro gerador uraniano), a ordem, a
constância das espécies, e tornando assim impossível toda procriação
desordenada e nociva.
Com base na mitologia grega, André Virel caracterizou
perfeitamente as três fases essenciais da evolução criadora. Urano (sem
equivalente romano) situa-se na primeira fase: a efervescência caótica e
indiferenciada, denominada cosmogênese.
Cronos (Saturno) intervém na segunda fase, a da esquizogênese: ele corta, divide. E quem, com um golpe de
foice sobre os órgãos de seu pai, põe um fim a suas secreções indefinidas. Representa
um tempo de suspensão. Ele é o regulador que bloqueia toda criação do
universo... o ponto fixo da onda estacionária, a vida no seu lugar, sem
avançar, sempre idêntica a si mesma. Ele é o tempo simétrico, o tempo de
identidade.
O reino de Zeus (Júpiter) caracteriza-se por um novo
início, mas um início organizado e ordenado, e não mais anárquico e sem
controle, que André Virel chama autogênese.
Depois da descontinuidade da época precedente, cujas
paradas, tempos, medidas, fixações permitiram uma primeira classificação, a
continuidade da evolução recomeça. É o momento em que o homem
toma claramente consciência de si mesmo, ao mesmo tempo em que toma consciência
das relações de causalidade, da delimitação dos seres e das coisas que ele
apreende nas suas analogias e suas diferenças... A história mitológica dos
deuses esclarece (então) a história dos homens.
A mitologia é assim apresentada como uma psicologia
projetada no mundo exterior, não apenas
uma psicologia individual, como a entendia Freud, mas também uma psicologia
coletiva, como a concebe Jung.
Dicionário de Símbolos, J. C. & A. G.
Mosaico de Urano e Geia. Fonte: Wikipedia. |
O mito
do deus Urano
O céu personificado, filho de Gaia (a Terra), ou de
Áiter.
Na teogonia órfica Urano e Gaia eram irmãos, filhos
de Nix (a Noite), e em outra genealogia Urano era omarido de Gaia, com a qual
teve numerosos filhos, entre os quais estavam os seis Titãs e as seis
Titanides, os três Cíclopes e os três gigantes Hecatônqueires.
Gaia, desgostosa de tanto procriar, pediu aos seus
filhos proteção contra a insaciabilidade amorosa de Urano. O único a concordar
com seu pedido foi Cronos (o filho mais novo), que, armado com uma foice
afiadíssima, preparou uma emboscada contra o pai, castrou-o e lançou-lhe os
testículos no mar.
A mutilação teria ocorrido no cabo Drêpanon, cujo
nome derivaria da foice de Cronos (Drêpanon em grego – foice). Noutras fontes o
local teria sido a ilha de Côrcira (a atual Corfu), que se chamou
sucessivamente Drêpanon, Feácia e Esquéria; essa ilha, cuja forma lembra uma
foice, seria a própria foice de Cronos lançada no mar, e os feácios, seus
habitantes, teriam nascido do sangue de Urano.
Numa terceira versão a mutilação teria ocorrido na
Sicília, cuja fertilidade seria uma consequência do sangue divino derramado
sobre o seu solo.
Numa versão divergente da lenda, de fundo
racionalista, Urano aparecia como o primeiro rei dos atlântios, habitantes de
um território extremamente fértil situado nos confins do Ocidente, nas margens
do Oceano, reverentes para com os deuses, que teriam nascido entre eles, e
generosos para com os povos vizinhos. Eles viviam isolados uns dos outros, e
Urano reuniu-os numa cidade amuralhada, ensinando-lhes o uso dos frutos
cultivados e a maneira de guardá-los, além de outras instituições úteis.
Sendo um observador atento dos astros, Urano previa
muitos fenômenos ocorrentes no mundo e introduziu o calendário com base no
movimento do sol e da lua, instruindo os atlântios a respeito das estações que
se sucediam ano após ano. Esses homens, até então ignorantes do movimento
eterno dos astros e maravilhados com o acerto das previsões de Urano,
imaginaram que ele fosse um deus, e depois de sua morte passaram a tributar-lhe
honras divinas, dando o seu nome ao próprio céu.
Atribuiam-se a Urano e a Gaia duas profecias: a de
que o reinado de Cronos terminaria quando ele fosse vencido por seus próprios
filhos, e a de que Zeus deveria precaver-se contra a criança que teria de
Métis. Receoso dessa profecia, Zeus engoliu Métis quando ela estava grávida de
Atena.
Dicionário de Mitologia Grega e Romana, M da G. K.
A lenda
de Geia e Urano
Geia primeiro engendrou o estrelado Urano. Ela o fez
semelhante a si mesma, para cobri-la e envolvê-la por todos os lados,
tornando-a assim um lugar seguro para os deuses venturosos.
Após se unir a Urano, Geia concebeu: Oceano, de
profundos redemoinhos, Ceos, Crio, Hiperíon e Jápeto; Teia, Reia, Têmis,
Mnemósina e Febe, de dourada coroa, além da amorosa Tétis. Depois desses,
nasceu o astuto Crono, o mais jovem e o mais terrível dos filhos, que odiou seu
vigoroso pai.
E todos os filhos que nasceram de Geia e Urano,
filhos terríveis, foram odiados desde o começo por seu pai. Assim que nasciam,
ele os escondia nas profundas entranhas de Geia, impedindo-os de sair à luz.
Urano se comprazia por seus feitos malignos, enquanto
a prodigiosa Geia gemia, sob sua opressão. Então Geia criou uma espécie de
pedra dura e cinzenta, com a qual entalhou uma grande foice e, ousadamente,
revelou aos filhos o plano que havia concebido, dizendo o quanto estava aflito
o seu coração.
“Filhos meus, gerados por um pai brutal! Se me
atenderdes, juntos nos vingaremos do cruel ultraje de vosso genitor, uma vez
que foi ele quem primeiro concebeu ações tão indignas.” Assim disse Geia, mas
como o temor se apoderasse de todos eles, nenhum disse uma palavra sequer.
Apenas o grande Crono, o de mente tortuosa, teve
coragem e respondeu à sua prudente genitora com estas palavras: “Mãe, eu posso
me encarregar dessa empresa, pois não reverencio nosso pai, de maligno nome,
por ter sido ele quem primeiro tramou ações indignas”.
Assim ele falou, e a prodigiosa Geia sentiu grande
alegria em seu coração. Colocou o filho escondido, pronto para uma emboscada, e
revelou seu ardiloso plano, armando suas mãos com a foice afiada, entalhada
como um aguçado dente.
Com a chegada da noite, aproximou-se Urano, desejoso
de amor, e estendeu-se sobre Geia, cobrindo-a completamente. Então, de seu
esconderijo, o filho estendeu a mão esquerda e o tocou. Com a mão direita,
tomou a foice, semelhante a um enorme dente, e cortou rapidamente os genitais
do pai, lançando-os a esmo para trás de si.
Teogonia, H.
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